GUEST POST por Leo Gonçalves*
americanos cantam o corpo elétrico
e quem cantará o corpo eletrônico bytes bits pixels?
qual ciborgue tomará a palavra no terceiro milênio?
já existem as máquinas de pensar
e quem fabricará a máquina de fazer poemas?
eu canto o corpo orgânico com ou sem órgãos
eu canto as palavras velhas
não digo nada de novo
minhas palavras são mais velhas que o fogo
a língua que se falava antes de babel
o que já foi dito um milhão de vezes por todos
o que já foi dito por você
o que já foi dito por ele por ela por mim
palavras de um autômato rimas casuais
verdades múltiplas repetidas pela milionésima vez
a você a ele a ela a mim
eu canto os corpos desnudos e suados
uns sobre os outros ávidos movendo-se como um
corpo sem órgãos ou um corpo com órgãos demais
a perda do pudor
o êxtase público
sou o porta voz de todos os orgasmos
orgasmos de todas as espécies orgasmos das
esposas mudas em seu medo de amar
orgasmos dos punheteiros orgasmos das crianças
dos garotinhos de dez anos e das menininhas
virgens dos prisioneiros dos sádicos dos loucos
as ejaculações precoces as ejaculações pós-coito
os gritos pagos das prostitutas nos filmes pornográficos
orgasmos pretensiosos
que almejam alcançar o céu
numa deliciosa confusão de línguas
wtc babel orgasmos múltiplos exibidos na tv
o maior show da terra
cena: adolescente filho único nu se masturba loucamente com o pau na mão e um dedo no cu é flagrado pela mãe que grita me segura qu’eu vou dar um troço desmaio porra voando em direção à parede do banheiro
no fundo no fundo todos querem alcançar o céu
nada de asas nada de propulsão
concreto armado até os dentes
fundo falso na paixão bíblica fabricado em nagasaki por um indiano
islamita especializado em segredos de fechadura
eu canto o fundo falso
eu sou o fundo falso
eu sou a fechadura
e a chave do mistério divino
eu sou o mistério divino
por isso canto o corpo histérico
o rebolado das groupies desvairadas
enlouquecidas pela minha saliva
que espalho sobre o chão do terreiro
e inauguro com elas
o meu próprio mistério
pois é mister cantar
.
* Leo Gonçalves é mineiro, da boa safra de 75, poeta e tradutor. Autor de WTC Babel S. A. (Barbárie, 2008) e das infimidades (in vento, 2004). Para as biscates, tão importante quanto isso: foi finalista dos #BonitoesdaTL, versão 2011, arranha o violão com carinho e tem uma coleção de palavras boas que sabem fazer parar ou passar o tempo em conversas que adormecem a lua. Encontra-se o poeta aqui e ali e a esquina mais certa é essa: Salamalandro.
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