Divagando sobre o cavalheirismo

Isso mesmo, divagando. É que o meu olhar ainda é bem errante quando penso no que a ideia de um “perfeito cavalheiro” significa nos dias de hoje. Ainda mais considerando que tal ideia remete apenas à  heteronormatividade e à monogamia, excluindo assim toda a diversidade de possibilidades que permeiam os relacionamentos.

Dia desses, ouvi pensativa e hesitante as opiniões de algumas conhecidas. Pensativa porque fiquei inevitavelmente comparando o posicionamento delas com o meu. E hesitante porque não cabe a mim a função de dar pitaco nas escolhas individuais alheias. Exceto quando tentam me convencer de que tais escolhas são unilaterais e iguais para todas nós e que o meu jeito de encarar a vida é um grande equívoco…

Uma delas disse que em hipótese alguma toparia dividir a conta de um jantar, por exemplo. “Se ele não gastar o dinheiro dele comigo, o fará com outras”, disse ela. Motel então? Nem pensar! A outra afirmou que até toparia “rachar” de vez em quando. Desde que isso não se tornasse rotina. “Sabe como é, né? O cara fica folgado”. Oi?

Depois, ambas disseram  que o meu papo de “direitos iguais” era bobagem, oriunda da minha falta de experiência e que cedo ou tarde, eu aprenderia. E que eu deveria reconhecer o meu valor (uhum, eu tenho mesmo que ter um preço, né?) e ser menos rude. Afinal, meu namorado poderia não gostar (!) do fato de eu nunca demonstrar um momento de fragilidade. Então tá, né?

Eu, assim como a maioria das pessoas que conheço, sempre tive afinidade com quem é gentil e educad@. Gosto de gente que demonstra solidariedade e respeito pelos outros e que procura tratar a todos da melhor forma possível. E nesses todos, incluo idosos, crianças, amigos, parentes, o tiozinho da padaria, vizinhos, colegas de trabalho… Não apenas as mulheres.

Logo, qual o problema em dividir a conta? Ou até mesmo em pagar toda a conta? Eu, por exemplo, trabalho bastante e ganho o suficiente para arcar com minhas despesas. No que o fato de alguém me bancar, de me trazer flores e presentes ou abrir a porta do carro faz com que eu me sinta mais especial ou valorizada, apenas por ser mulher? Ou melhor: qual o problema de, quando um estiver em uma condição financeira menos privilegiada , o outro  propor-se a pagar?

Defendo com todas as minhas forças as lutas para que estes conceitos um dia mudem. Não seria bem mais bacana se a gente aprendesse a coexistir em meio às gentilezas, sem olhar a quem? Sem esperar algo em troca? Sem que isso só sirva para inflar o ego ou pior: para mascarar a perpetuação de uma (dentre tantas) relação de poder que engendra fragilidade (atribuída as mulheres) x proteção (atribuída aos homens)?

Certamente, o real equívoco desta história toda esteja no fato delas acreditarem que não querem ter “direitos iguais”. Por mais que eu não concorde e pense que a forma delas agirem não me represente, sei que elas só podem sonhar com os “perfeitos cavalheiros” porque são livres para isso. Quem sabe um dia elas não descobrem por elas mesmas?

 

Sobre Cláudia Gavenas

Paulistana, 26. Designer, gateira, feminista e musical. Meio perdida na vida, mas não tem certeza se realmente quer se encontrar...
Esse post foi publicado em relacionamentos e marcado , , , , , . Guardar link permanente.

5 respostas para Divagando sobre o cavalheirismo

  1. Muito bem divagado! Acredito que 50/50 é a melhor política para divisão de contas quando o nível do relacionamento não inclui morar juntos e pagar despesas fixas. Agora quando esta situação é aplicada, para mim, a melhor solução seria aplicar proporcionalidade de pagamento com salário, até porque é muito raro o casal ter exatamente o mesmo salário.
    Grande abraço!

  2. mclarags disse:

    Amo enxergar o que não tinha se revelado ainda pra mim. Amo o fato de me tirarem a venda sem nenhum pudor aqui nessa biscatagi deliciosa. Amei Cláudia!

  3. Paula disse:

    Eu fico com preguiça dessas conversas. Outro dia estava num almoço com vários casais e ouvi uma esposa dizer, cheia de autoridade, q tinha vontade de fazer uma tese sobre a “prostituição velada no casamento”. Pq, segundo ela, toda mulher faz sexo em troca de uma viagem ou um vestido caro de vez em quando. Quando vi todas as outras concordando, tive certeza q eu era um ET. Principalmente qdo eu disse q uso o sexo pra sentir prazer e alguns segundos de silêncio constrangedor se fizeram.
    E eu perguntei só pro meu marido: que século é hoje?

  4. Mto bom seu ponto de vista! Concordo com você, embora seja dificil manter estes pensamentos/atitudes na prática. Mas, a mente vai sendo educada. Adorei o texto!

  5. Tamiris disse:

    Sempre discuto isso com as minhas amigas e sou tachada de ”Orgulhosa”, amei o texto e acabei de enviar para todas , pra vê se elas deixem de implicar comigo rsrsrs ! amei o texto . simplesmente divino

Deixar mensagem para Luciana (@luciana_NE) Cancelar resposta